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Moscou nunca morre

[Verão passado em Moscou, em uma fonte que fica na Praça Vermelha, pryamo vot tak!] Precisávamos no mínimo falar MUITO e ouvir QUALQUER COISA em português. A distância da definição e do reconhecimento de uma língua materna só aumentava e francamente, a neve consegue piorar qualquer coisa, não importa o que ela seja. Seria uma noite calma no hotel, deixar o booze de lado, então ficamos no quarto vendo Jean Charles, aquele filme do brasileiro que é morto no metrô de Londres porque fora confundido com um terrorista. Na manhã seguinte estávamos em Moscou, depois do atentado ao metrô, as palavras que se podia pegar no ar eram: bomba, metrô, Lubyanka (a estação). Entendi isso quando cheguei a estação, em outro trem, e ela estava cheia de flores. E se eu tivesse acordado mais cedo? Daqui a pouco o Jornal Nacional estaria lamentando a minha morte. Poupei o Brasil disso, gravamos um vídeo na frente da estação (preguiça de upá-lo, mas é uma chacota do tipo "Eu estou aqui na frente da estaçã...

Peixe de asfalto

[Mais que justamente dedicado a todos os moradores do Meireles em Fortaleza] Well I go to the country to find myself Crawl back to the city to lose myself again Under lights this joke is wearing thin Well it's easy to be a winner when you don't know what you've lost It's easy to be a believer In you Lá fora chove, provavelmente a evolução nos presenteou com mais sessenta e cinco espécies de peixe encontrados única e exclusivamente em enchentes, nadando sobre o asfalto. Que o mundo perdeu o equilíbrio é muito claro: existe uma cratera no final da Abolição, há quem fale em meteoritos mas foi só a vontade da água. E ainda quando falta luz em um bairro inteiro, que não sabe funcionar sem seus semáforos, você realmente se pergunta "what the hell". No entanto, enquanto eu olhava pela janela minuto sim, minuto não, ouvindo música do mp3 e deixando ao léu um computador sem internet e duas horas de bateria, em uma dessas vezes as luzes de todos os prédios começaram a s...

O cão que rebolava e outras coisas

[Escrito em meados da primavera de 2010] [ Incrível é descobrir o verde depois de seis meses de branco, em Abril ] Então eu tive que ficar em pé. Depois da conferência, eu sentia que eu tinha perdido aquela energia protetora. Eu andava nos ônibus pela cidade, e ninguém me lançava o olhar acusador ou curioso de espécie única, brasileira. Agora eu sentia que, depois de conferências demais, eu já tinha sido descoberta. E aquele pensamento de achar que todos os tipos aleatórios de pessoas nunca saberiam que cruzaram, nessa vida, com uma brasileira, já tornara-se duvidoso. Na última semana, tive três conferências. De repente eu sou uma pessoa muito interessante e as pessoas querem me ouvir. Sem nenhum objetivo, anda pelo centro comercial. Compro meias, calcinhas com tema Rússia (uh?), adesivos de matrioshkas para pregar em ovos para a Páscoa que se aproxima. Não sabia o quanto da minha dignidade e identidade ainda sobravam depois desse domingo. Elena, a coordenadora que me estendeu a insani...

Flor impossível, e ponto.

Estado de espírito: Modern Drift, Efterklang Hoje entendi que meu pai vai morrer. Não chorei, mas isso não quer dizer que não tenha perdido o chão. É como sentir falta de ser inteira, sentir falta de uma estrutura que eu nunca tive realmente, e o mais, pensar que é impossível saber como é tê-la. Fechei os olhos, ao invés de chorar, vi um mar inteiro, um dia ensolarado, e de repente o impossível, uma flor nascia no meio da areia e eu podia me agarrar ao impossível, era tão real que as pétalas, palavra, eram macias, feito veludo. Hoje entendi que meu pai vai morrer e juntei tudo que eu tinha dele: as lembranças, o rosto que é a xerox, a joanete igual, o temperamento. E vi que apesar de não ter tido a estrutura-pai, depois de ter juntado tudo que eu tinha dele, e que era tudo que eu tinha, do pé a cabeça, literalmente, então talvez eu seja a estrutura, talvez eu tenha tido essa mania de querer ser forte, de querer ser o "açougueiro com a tatuagem de rosa no braço". Nasci na falt...

Ser circular é difícil

Desgraça, eu disse, me enrolando mais nos lençóis, como se aquilo fosse me prender mais a cama e eu não tivesse que levantar, que desgraça, repito, e pratico um ato de auto-mutilação com pouquíssimo efeito, já que é contra a cama. Saio de casa, coisas na bolsa, e toda a coragem necessária para enfrentar o Sol do Ceará ao meio-dia. Ora, ao menos venta, Rianne, eu me conforto, já que há um mês atrás passei um tempo com os meus avós no Piauí e foi no mínimo panque, minha gente. Por que eu não sei do resto do mundo, mas eu gosto dos banhos que têm prazo de validade de refrescamento de pelo menos uma hora, não gosto quando saio do chuveiro e já começo a suar, e nada realmente concreto consegue vir a minha cabeça ou substituir o pensamento de "QUE CALOR, QUE INFERNO, POR QUE?". Pelo menos venta, continuei. Perdi o ônibus, aparentemente eu tinha que fazer sinal e estava burra e recém-acordada demais para conseguir funcionar. Esperei mais vinte minutos pelo outro, enquanto fazia pequ...

Eu vou consertar sua cabeça.

[Estado de espírito: natalizado e gordo] [Escutando: Stomach, Current Swell ] [ Corretores de joanete, tunando o seu pé desde 1980 ] Talvez eu perca a sanidade. Hoje. Alguém tinha levado um tiro. Tráfico de drogas. Gente que usa bigode. Gente grande. O trambolho debaixo do meu pé, a bala. Afastei o pé esquerdo e a bala ficou entre os dois pés. Estado semi-acordado de consciência. E os olhos que acordam num domingo às 8 da manhã, sentindo os aparatos de silicone para a joanete. Eu estava na aula de alemão quando ela me puxou pelo braço, sem escrúpulos quanto a professora e quebrando o clima que as aulas de alemão têm. Ela sempre falava perto demais, doce demais, gentil demais. Foi ali, me encurralando naquele corredor que ela disse que seria bacana falar para toda a escola, na sessão de línguas estrangeiras, um pouco sobre mim. E em cinco línguas, bem bacana. Entre todas as coisas que se podem acontecer num Domingo, entre todas elas o destino me reserva a tarefa de contar para o mundo,...

Fueda-se.

Mas minha senhora, eu disse, eu tenho que embarcar, não é simplesmente uma vontade! Ela, alta demais para uma mulher e obesa, branca e com o cabelo super claro, eu diria albina, mas a fenótipo dela me importava ao mínimo naquele momento. Acho que eu não estava sendo clara, então me repeti. Que diabos, pensei, por que parei em São Paulo só para comprar um livro? Qual o meu problema? Eu poderia ter pedido essa merda pela internet. Por algum motivo eu estou em Madrid e tenho que embarcar de um PORTO? E não de um AEROPORTO? Ok, isso está offly wrong. NO SHIT. ... Acordo, suada, meio perdida na definição de um pesadelo. Os meus, pessoalmente, sempre envolvem logísticas e conexões em aeroportos, olhares de impossibilidade vindo de funcionários, um longo suspiro e a desistência da vida. Se houver por aí, minha gente, uma Síndrome do Pânico a Logística Aeroportuária, ela é toda minha. Lembro que tentando chegar ao Brasil em Julho, quando saindo de Moscou, e aliás, nunca contei essa história p...